SAÚDE MENTAL DE ESTUDANTES

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    Dispõe sobre a atenção à saúde mental de estudantes com histórico de evasão escolar, no âmbito do Município de Três Corações/MG.

    Art. 1º Ficam os alunos da rede municipal de ensino, com histórico de evasão escolar, autorizados a receberem atendimento psicológico prioritário pelos profissionais competentes que atuam na rede municipal de saúde, no âmbito do Município de Três Corações.

    Parágrafo único. Entende-se, para os fins dessa Lei, que evasão escolar é saída antecipada, temporária ou definitiva, antes da conclusão do ano, série ou ciclo, por desistência, representando, portanto, condição de insucesso em relação ao objetivo de promover o aluno a uma condição superior a de ingresso, no que diz respeito à ampliação do conhecimento, do desenvolvimento cognitivo, de habilidades e de competências almejadas para o respectivo nível de ensino.

    Art. 2º O atendimento psicológico especificado no artigo 1º será realizado sob anuência do interessado, em locais e horários previamente determinados, a partir de encaminhamento específico advindo:

    I – dos pais do aluno;

    II – do Conselho Tutelar;

    III – de outros profissionais de saúde;

    IV – da direção escolar;

    V – dos psicólogos e assistentes sociais que atuam nas escolas;

    VI – outros.

    Art. 3º Os atendimentos psicológicos se darão por tempo indeterminado, com o objetivo de acolher a pessoa que está tendo comprometido, por evasão escolar, seu desenvolvimento escolar.

    § 1º O acolhimento referenciado no caput tem por fim a construção de um vínculo que seja, ao mesmo tempo, terapêutico e operativo, identificando as dificuldades que impedem o acesso do aluno à escola e fortalecendo-o para lidar com tais demandas;

    §ª 2º Dentre as dificuldades referenciadas no parágrafo anterior, podemos distingui-las agregadas em três grupos, quais sejam: fatores referentes a características individuais do estudante; fatores internos à instituição escolar; e, fatores externos à instituição escolar;

    § 3º Para os fins a que se propõe o acolhimento, o profissional de psicologia poderá atuar em rede, quando necessário, encaminhando ou solicitando a abordagem de outros profissionais, em especial, profissionais de psicologia e de serviço social que atuam junto à rede municipal de ensino, conforme disposto na Lei Municipal nº 4668/2022.

    Art. 4º Sempre que possível, a assistência psicológica ao aluno deverá ser precedida por consulta aos seus pais, quando se objetivará contextualizar a situação de evasão escolar.

    Parágrafo único. Se necessário, e quando solicitado, atendimentos psicológicos também poderão ser estendidos aos pais do aluno objeto dessa Lei.

    Art. 5º O Poder Executivo Municipal está autorizado, para os fins dessa Lei, a estabelecer parcerias com instituições educacionais, organizações não governamentais, associações, fundações, órgãos governamentais e outros da sociedade civil, e com instituições públicas e privadas de saúde.

    Art. 6º O Poder Executivo Municipal regulamentará a presente Lei, no que couber, no prazo máximo de 60 (sessenta) dias.

    Art. 7º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, nos termos do art. 174 da Lei Orgânica Municipal, revogadas as disposições em contrário.

    Complemento

    Justificativa:

    O presente Projeto de Lei objetiva, sobretudo, autorizar os alunos da rede municipal de ensino, com histórico de evasão escolar, a receberem atendimento psicológico de forma prioritária pelos profissionais competentes que atuam na rede municipal de saúde, no âmbito do Município de Três Corações.

    A evasão escolar é um problema que a educação brasileira enfrenta há muito tempo. Sabe-se que há um esforço das autoridades e de pessoas que estão envolvidas no processo educacional, em busca de soluções que erradiquem o fenômeno da evasão escolar, como por exemplo, a obrigatoriedade da escola notificar, ao Conselho Tutelar e a outros órgãos sobre tais ocorrências. Ainda assim, tais medidas não são suficientes, pois o número de crianças e jovens fora da escola ainda é muito alto.

    Partindo do pressuposto de que experiências de sucesso e fracasso são comuns nas experiências dos seres humano, independe de religião, gênero, raça, situação politica, econômica ou social, contudo, quando unimos a palavra “fracasso” ao termo “escolar”, mergulhamos em um contexto mais específico. Rodrigues de Paula, 2009, defende que fatores intra-escolares e extraescolares podem ser apontados como alguns possíveis motivos para o fracasso escolar. Fatores intra-escolares, como o próprio nome já diz, tem relação com problemas relacionados à escola, e ocorrem no âmbito escolar. Dizem respeito a questões relacionadas às metodologias de ensino, métodos avaliativos, relação dos professores com alunos, programas escolares, projetos pedagógicos e outros. Já os fatores extraescolares, são fatores externos à escola, problemas ou situações que os alunos estão envolvidos fora do ambiente educacional, geralmente com a família, e tem relação com a falta de moradia dos alunos, falta de alimentação, má condição de vida, violência, falta de transporte escolar, necessidade de trabalhar para ajudar a família, entre outros.

    De acordo com um estudo realizado por Reynaldo Fernandes, com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Ministério da Educação (MEC), os jovens de baixa renda, em sua maioria negros, forçados precocemente ao mercado de trabalho ou que engravidam já na adolescência, formam o grupo de maior risco à evasão. Fernandes aponta ainda que esses fatores “externos” à atividade propriamente escolar se articulam a um processo contínuo de desinteresse e desengajamento, levando por fim ao abandono. Além disso, é na adolescência que o problema se apresenta com maior intensidade. Em 2019, 7% da população entre 15 e 17 anos estava fora da escola, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD – 2019), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

    Pode-se entender que o avanço escolar está ligado às questões raciais e socioeconômicas. Enquanto pessoas brancas e de renda mais elevada alcançam níveis mais altos de escolaridade, pessoas negras e de renda mais baixa tendem a ter um menor índice de avanço escolar. E mesmo entre os mais pobres, os piores indicadores educacionais são observados entre os estudantes negros. Essas disparidades são fruto do racismo estrutural existente na sociedade brasileira, que é expresso pela desigualdade persistente nos indicadores educacionais e econômicos, refletidos nos ambientes familiares. Estes dados mostram que o choque socioeconômico faz com que alunos deixem a escola não só por terem que sustentar suas famílias, mas também por não terem condições financeiras de manter a frequência escolar. Sem condições de pagarem transporte até a escola e sua alimentação, por exemplo.

    Estudos internacionais mostram que a escolaridade é uma variável chave na obtenção de progresso econômico e bem-estar para um país e seus cidadãos. Isso quer dizer que pessoas escolarizadas ocupam os melhores postos e têm menos probabilidade de se tornarem desempregadas. Isso quer dizer que um nível maior de escolaridade faz com que o trabalhador tenha maiores salários e maiores taxas de crescimento econômico. E não só isso: para além de aspectos financeiros, a escolaridade é associada a benefícios não-econômicos: redução da criminalidade, segurança, saúde, redução dos números de gravidez na adolescência, etc.

    De acordo com a projeção da PNAD 2019, ao menos 1,5 milhão de crianças e adolescentes estão fora da escola no Brasil. Como vimos, muitos são os fatores que contribuem para o abandono e a evasão, sempre articulados às desigualdades estruturais de nosso país. Enquanto, por exemplo, apenas 12,5% dos jovens brancos de 15 a 17 anos estão fora da escola, entre os jovens negros esse índice chega a 19%. Esse cenário motivou o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) a criar a Busca Ativa Escolar, uma metodologia intersetorial de enfrentamento e prevenção ao abandono e evasão de crianças e adolescentes da Educação Básica, em parceria com as secretarias municipais tanto de Educação quanto de Saúde e Assistência social.

    Muitas outras experiencias têm sido exitosas para lidar com a evasão escolar, especialmente aquelas que consideram a realidade local e os recursos disponíveis para uma intervenção que reaproxime o aluno da escola. Nesse Projeto de Lei, estamos propondo uma outra abordagem, voltada exclusivamente para a atenção e escuta do maior interessado na questão, o próprio aluno. Atenção e escuta diferenciadas, realizadas por profissionais da psicologia.

    Assim, por sua importância social e por se tratar de um problema que pede nossa criativa intervenção, peço aos nobres Pares dessa Casa Legislativa, sua aprovação.

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