Dispõe sobre as diretrizes para as ações de Promoção da Dignidade Menstrual, de conscientização e informação sobre a menstruação, do fornecimento de absorventes higiênicos.
Art. 1° Ficam instituídas, no âmbito municipal, as diretrizes das ações de Promoção da Dignidade Menstrual, que serão regidas nos termos desta Lei.
Art. 2º As ações instituídas por esta Lei têm como objetivos a conscientização acerca da menstruação, assim como o acesso aos absorventes higiênicos femininos, como fator de redução da desigualdade social, e visa, em especial:
I – combater a precariedade menstrual;
II – promover a atenção integral à saúde da mulher e aos cuidados básicos decorrentes da menstruação;
III – garantir a universalização do acesso, às mulheres pobres e extremamente pobres, aos absorventes higiênicos, durante o ciclo menstrual;
IV – combater a desinformação e tabu sobre a menstruação, com a ampliação do diálogo sobre o tema nas políticas, serviços públicos, na comunidade e nas famílias;
V – combater a desigualdade de gênero nas políticas públicas e no acesso à saúde, educação e assistência social;
VI – reduzir faltas em dias letivos, prejuízos à aprendizagem e evasão escolar de estudantes em idade reprodutiva;
VII – promover a saúde de pessoas trans masculinas, não binárias e gênero fluído.
Art. 3º As ações de Promoção da Dignidade Menstrual de que trata esta Lei consistem nas seguintes diretrizes básicas:
I – desenvolvimento de ações e articulação entre órgãos públicos, sociedade civil e a iniciativa privada, que visem ao desenvolvimento do pensamento livre de preconceito, em torno da menstruação;
II – incentivo à promoção de palestras e cursos nos quais a menstruação seja abordada como um processo natural do corpo feminino, com vistas à proteção à saúde da mulher;
III – elaboração e distribuição de cartilhas e folhetos explicativos que abordem o tema da menstruação, objetivando ampliar o conhecimento e desmistificar a questão;
IV – disponibilização e distribuição gratuita de absorventes, pelo Poder Público Municipal, às mulheres cadastradas.
Art. 4º O disposto no inciso IV do art. 3° desta Lei aplica-se às mulheres em situação de vulnerabilidade.
Art. 5º Para efeitos desta Lei serão utilizados os indicadores sociais do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), CadÚnico e dados disponíveis no Centro de Assistência Social de Três Corações/MG, para a definição das mulheres em situação de vulnerabilidade.
Art. 6° As despesas decorrentes com a presente Lei decorrerão por conta de verbas próprias do orçamento vigente, suplementadas se necessário.
Art. 7° A presente Lei será regulamentada pelo Executivo no prazo de 30 (trinta) dias, contados da sua publicação.
Art. 8° Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação nos termos do art. 174 e §1º da Lei Orgânica Municipal.
Complemento
JUSTIFICATIVA:
Senhor Presidente,
Senhora Vereadora,
Senhores Vereadores,
A presente proposição deseja estabelecer um programa de políticas públicas para combater a chamada “pobreza menstrual” e seus problemas derivados. Esse é um programa necessário e prioritário, uma vez que afeta aproximadamente XX% da população do município: de acordo com dados do último censo demográfico (IBGE 2010), em Três Corações/MG tem uma população de 17.471 meninas e mulheres entre 10 e 44 anos, dentre os 72.765 Habitantes.
A menstruação é um processo natural das pessoas do sexo biológico feminino. No entanto, há muita desinformação sobre esse processo, o que pode colocar as meninas e mulheres em uma situação de vulnerabilidade. Devido à relevância do tema, este vem ganhando espaço no debate público na última década. Em 2014, por exemplo, a Organização das Nações Unidas (ONU) reconheceu que o direito das mulheres à higiene menstrual é uma questão de Saúde Pública e de direitos humanos.
Num contexto de desigualdade de renda que permeia o nosso município (Índice de Gini de 0,5655) , o que é um direito muitas vezes se torna um luxo. Os ciclos menstruais demandam tempo e dinheiro mensais para seu manejo. Fazendo uma estimativa média do custo, durante um intervalo de 40 anos, as mulheres têm aproximadamente 450 ciclos menstruais. Se considerarmos que são usados 20 absorventes por ciclo e que o custo médio de um absorvente seja igual a R$0,35, a compra de absorventes ao longo da vida tem um custo mínimo de R$ 3.000. De acordo com a PNAD Contínua (IBGE, 2020), a renda anual dos 5% mais pobres é de R$ 1.920.
Portanto, as mulheres que se encontram dentro desta faixa de renda precisam trabalhar até 4 anos para custear os absorventes que usarão ao longo da vida.
Considerando esses gastos, a menstruação se torna um fator agravante não só de desigualdade social, mas também um problema de Saúde Pública, à medida que parte das pessoas que menstruam não tem acesso às informações e aos meios devidos de cuidados da saúde e higiene menstrual. Por um lado, mulheres sem condições de compra de absorventes acabam utilizando materiais indevidos para esse fim, como miolo de pão, algodão, entre outros, que podem ocasionar infecções e outros problemas graves de saúde. Uma pesquisa de 2018 da marca de absorventes Sempre Livre apontou que 22% das meninas de 12 a 14 anos no Brasil não têm acesso a produtos higiênicos adequados durante o período menstrual. A porcentagem sobe para 26% entre as adolescentes de 15 a 17 anos.
Por outro lado, o acesso a equipamentos e facilidades de higiene é um desafio maior e estrutural do país com um todo, uma vez 5,4 milhões de pessoas vivem em domicílios sem banheiro (PNAD Contínua, 2019). Com o aumento da pobreza e da extrema pobreza decorrente da pandemia5, é possível que o número de pessoas vivendo em condições de saneamento inadequadas seja maior em 2021. E consequentemente, o desafio da “pobreza”
strual” deve se agravar.
As consequências desse problema de “pobreza menstrual” são graves e podem ter efeitos de longo prazo para o desenvolvimento humano de parte relevante da população do nosso município. No quesito Educação, estima-se que 1 a cada 4 jovens já faltou à escola por não possuir absorvente. Para além de poder comprar absorvente, o absenteísmo escolar atrelado à menstruação pode se dar por outras razões, como cólicas, cefaleia e outros mal-estares ligados ao período menstrual, bem como pela falta de infraestrutura para o adequado manejo da higiene menstrual, incluindo acesso a instalações seguras e convenientes para descartar materiais usados.
A primeira menstruação acontece, em média, aos 13 anos, idade que, em uma progressão normal de ensino, corresponde ao sétimo ou oitavo ano do Ensino Fundamental. Dali até o fim do Ensino Médio, por 5 a 6 anos, elas dependerão das condições oferecidas na escola para realizar o manejo de sua higiene menstrual. O Brasil tem hoje cerca de 7,5 milhões de meninas nessa condição – meninas que menstruam na escola8. O banheiro não é só condição para a troca de absorventes. É também um espaço de privacidade, muitas vezes necessário para um respiro quando a menstruação vem acompanhada de dores e desconfortos. Um dos raros estudos focados em meninas brasileiras, conduzido no interior de Pernambuco, observou que 31% das adolescentes já faltaram à escola em decorrência da menstruação9.
Um movimento que é atuante nesta frente é o Girl Up, movimento que nasceu em 2010, fundado pela Fundação da ONU, que funciona como propulsionador de jovens lideranças femininas, que pensam causas importantes para a promoção e defesa da mulher. O relatório feito pela organização Girl Up mostra que o acesso à dignidade e à higiene menstrual são importantes para a conquista de vários Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. Aproveito aqui para agradecer por toda a ajuda na construção deste projeto e por toda a luta que elas desenvolvem.
Um programa voltado para a naturalização, informação e fomento aos cuidados pessoais quanto à menstruação se torna necessário para trazer a compreensão que a pobreza menstrual é um obstáculo para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e para o consequente desenvolvimento de nosso município. Este projeto de lei reconhece ta importância de fazer circular informação entre todos os públicos, com especial atenção para tomadores de decisão – menstruem eles ou não.
Isto posto e certos da compreensão, esta Vereadora solicita aos nobres vereadores que compõem este Legislativo a aprovação do presente projeto de lei.