Hoje acordei um pouco mais tarde que o habitual e, abrindo a janela, vi eu a chuva havia parado e o céu estava azul. Saí para tomar café na padaria da esquina e, na avenida, passei por duas jovens que conversam, despreocupadas, felizes, e notei que elas estavam vestidas como se fossem a uma festa e, mesmo sem conhecê-las, também fiquei feliz.
Recuei a memória e pensei: houve um tempo em que nós, brasileiros, tínhamos vergonha, ou medo, de confessar felicidade. Se encontrássemos um amigo na rua e perguntássemos: “Como vai?”, ele nunca diria “estou bem”. Era sempre um vago “mais ou menos”.
Os velhos tinham nostalgia do passado e não aceitavam a renovação e olhavam a juventude com desprezo. Com eles, tudo o que havia acontecido antes era melhor.
Os jovens também não compreendiam sua juventude e cultivavam o sofrimento. Recordo-me de um poema de Francisco Otaviano que andava de boca em boca, nas salas dos colégios ou em qualquer lugar onde se reuniam esses jovens: “Quem passou pela vida em brancas nuvens/ e em plácido repouso adormeceu/ Quem não sentiu o frio da desgraça/ Quem passou pela vida e não sofreu/Foi espectro de homem/
Não foi homem/ Só passou pela vida, Não viveu”.
É claro que nenhum de nós tinha noção do que é sentir o frio da desgraça e, muito menos, do que é a vida. Aliás, para nós a vida era uma cidadezinha pacata, conversando com os vizinhos na frente de casa ou na varanda, onde o mundo mudava tão lentamente que nem dávamos conta de que sonhávamos e queríamos partir em busca destes sonhos.
Mas como nos sentíamos felizes ao recitar o poeta, da mesma maneira que cantávamos boleros e samba-canções de amores contrariados, mesmo sem ter conhecido o amor.
Por isto a felicidade das duas jovens estudantes me comoveu. Elas estão amando, eu disse, pois só a mulher que ama irradia uma luz tão intensa.
Confesso que senti inveja de seus namorados, ou namoradas. Que bom quando a gente sabe que nossa amada se veste – ou se despe – para nós.
Que bom quando a gente percebe que a beleza existe por nós, para nós.
Que bom acordar e ver, gratuitamente, esse belo espetáculo da vida.


